Em duas importantes decisões para a União, a Justiça Federal manteve a redução de benefícios fiscais do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para Exportadoras (Reintegra) estabelecida em decreto do governo federal este ano. A primeira medida suspendeu liminar que garantia até agosto crédito de 2% sobre as receitas de exportações aos associados da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo (Findes) e do Centro da Indústria do Estado (Cindes). A outra negou um pedido da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Centro das Indústrias do Estado (Ciesp) para a redução de créditos para 0,1% começar a valer apenas em 2019. No processo do Findes/Cindes, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) alega que o adiamento das mudanças no Reintegra tem potencial efeito multiplicador, "o que agravaria ainda mais a lesão à economia pública". Segundo o órgão, a prorrogação até o fim de agosto causaria impacto estimado em R$ 1,7 bilhão na arrecadação. "A decisão interfere de maneira absolutamente sensível na gestão financeira do governo federal e no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal", argumenta no pedido de suspensão. O Reintegra foi criado em 2011 pela Lei nº 12.546 para estimular as exportações e a competividade nacional, por meio da devolução de parte dos custos de tributos na produção desses bens. Em maio, porém, o Decreto nº 9.393 reduziu o benefício às exportadoras de 2% para 0,1%. O objetivo foi de compensar a queda na arrecadação federal decorrente da desoneração do diesel para os caminhoneiros. O Findes/Cindes conseguiram liminar favorável a 18 mil associadas (processo nº 00123 39-98.2018.4.02.5001). A PGFN contestou o argumento de que a medida iria contra os princípios da legalidade e da anterioridade tributária. Segundo a procuradoria, as Leis 10.865/2001 (artigo 23, parágrafo 5º) e 9.718/1998 (artigo 5º, parágrafo 8º) autorizam o Poder Executivo a alterar as alíquotas estabelecidas. Para a PGFN, não há obrigatoriedade de cumprir o prazo de 90 dias antes da vigência da norma para redução de benefício. O órgão utiliza como argumento julgamento do Supremo Tribunal Federal (RE 1.054.181). O desembargador federal e vice-presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, Guilherme Couto de Castro, acatou a argumentação do órgão. De acordo com o magistrado, "basta dizer, no caso, que a decisão combatida, tomada em juízo de cognição sumaríssima, é tumultuária, por conceder tratamento diferenciado aos contribuintes sediados em um determinado Estado, em detrimento dos demais" (processo nº 0007 002-96.2018.4.02.0000). O magistrado também considerou o risco de grave lesão à ordem e economia públicas. O gerente jurídico da Findes, Samir Furtado Nemer, afirma já ter entrado com recurso (agravo interno) contra a suspensão da liminar. "O TRF foi levado a erro pelos argumentos da União. Para haver lesão à ordem pública, a PGFN deveria ter comprovado violação a princípios, mas foi ela quem ofendeu princípios", diz. "Além disso, todo Estado que se sentir lesado tem o direito de recorrer ao Judiciário". Já na decisão contrária ao pedido da Fiesp e do Ciesp, a juíza Suzana Ferri, da 2ª Vara Cível Federal de São Paulo entendeu que a Fiesp não tem legitimidade para propor um mandado de segurança coletivo (processo nº 5013732-44.2018.4.03.6100). A entidade representa os sindicatos e não as empresas diretamente. Ao Ciesp, a magistrada negou o pedido liminar por entender que cumpre ao Executivo avaliar a fixação da alíquota do Reintegra "proporcionando a redução dos custos da importação sem ferir a necessidade de arrecadação estatal para arcar com seus deveres institucionais, sobretudo diante do surgimento de um déficit orçamentário". Por nota, o departamento jurídico da Fiesp e Ciesp, entidades que representam cerca de 150 mil empresas, informa que recorrerá. "Entendemos que a nova legislação feriu o princípio da não surpresa, da segurança e da anterioridade ao modificar, durante o exercício fiscal, condições já preestabelecidas. Este entendimento já foi inclusive externado pelo STF", diz por nota. Uma das decisões citada pelas entidades é da 1ª Turma do Supremo, de relatoria do ministro Marco Aurélio, publicada em maio (RE 964.850). O precedente é o mesmo mencionado por uma indústria de tintas paulista que conseguiu o direito de manter o percentual de 2% até o fim do ano. No processo, a advogada Priscila Dalcomuni, do Martinelli Advogados, que representa a indústria de tintas, citou a decisão da 1ª Turma do STF, que determina a aplicação da anterioridade anual (quando a alteração só pode valer a partir do ano-calendário seguinte) para a entrada em vigor do Decreto nº 8.415, de 2015. "A norma reduzia as alíquotas do Reintegra de 3% para 1%", diz a tributarista. No caso de majoração de contribuições (como o PIS e a Cofins), a Constituição Federal exige apenas a anterioridade nonagesimal. Contudo, segundo Priscila, a redução do Reintegra impacta os tributos federais em geral. "As exportadoras não conseguem usar os créditos acumulados para abater quaisquer tributos", afirma. Ao conceder a liminar, o juiz José Denilson Branco, da 3ª Vara Federal de Santo André (SP), entendeu que a redução da alíquota do incentivo fiscal concedido pelo Reintegra "traduz-se em aumento de tributo de forma indireta, segundo julgados do Egrégio Supremo Tribunal Federal" (processo nº 002151-51.2018.4.03.6126). A PGFN informou sobre o processo que "a seu tempo, será interposto agravo de instrumento contra a decisão liminar". Por nota, a procuradoria afirma que decisões do STF que aplicam a anterioridade tributária são uma variação de rota isolada. Laura Ignacio - São Paulo
Fonte: VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
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