A reforma tributária encabeçada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) já recebe críticas das entidades ligadas aos serviços, cujos estudos apontam elevação de carga tributária para as empresas do setor, principalmente para as que possuem muita mão de obra e processos de alta tecnologia. O projeto, que se consolidou na Proposta de Emenda Constitucional 45/2019, prevê a centralização da gestão da arrecadação de tributos da União, Estados e municípios em somente um órgão federal que, posteriormente, fará a distribuição dos recursos aos entes. Para uma parte dos especialistas, esse mecanismo pode ferir o princípio federativo de atribuição de funções e poderes, entre as diferentes esferas de governo. A PEC 45/2019, feita com base em um estudo do economista do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Bernard Appy, já foi aprovada em maio pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados e tem o apoio do líder da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Diante do adiantamento da Câmara, outras propostas começaram a circular, dentre elas a do próprio governo federal que prefere unificar alíquotas somente a nível federal (ao invés de incluir Estados e municípios), em um único imposto sobre os meios de pagamentos. Por outro lado, a PEC 45/2019 prevê a unificação de três impostos federais, um estadual e um municipal por um único tributo sobre bens e serviços, o IBS, ao modelo do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Estes são o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); o Imposto sobre a Circulação de Bens e Serviços (ICMS); Imposto Sobre Serviços (ISS); a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); e a contribuição para o Programa de Integração Social (PIS). Aumento de carga O assessor econômico da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Fernando Garcia de Freitas, comenta que a PEC 45/2019 prevê acabar com a cumulatividade do sistema de impostos, ou seja, que a empresa pague vários tributos em “cascata”, pela impossibilidade de abater crédito tributário. Ele explica que o projeto passará todo o sistema para a não cumulatividade. “As empresas não pagarão imposto sobre o que elas compram de matéria-prima e serviços. Somente sobre o que elas agregaram de valor”, esclarece. “Isso é muito benéfico para a indústria, por exemplo, que utiliza muita matéria-prima. Porém, os serviços não usam tanta matéria-prima como a indústria. O setor, portanto, não terá como abater créditos tributários”, acrescenta Freitas. A previsão é de que o IBS tenha uma alíquota de 25%, sendo que, atualmente, as empresas de serviços tributadas pelo Lucro Real, no sistema não cumulativo, costumam pagar uma alíquota de 14,25%, juntando ISS, PIS e Confins. “Os serviços de alta tecnologia também serão prejudicados. Em uma empresa de TI [Tecnologia da Informação], por exemplo, não há muita aquisição de matéria-prima. O principal impulso na agregação de valor ocorre por meio da inteligência, conhecimento e criatividade das pessoas”, diz Freitas. “As pessoas são o principal investimento em uma empresa de serviços de TI, porém isso não será passível de abatimento nos impostos, segundo a proposta da PEC 45/2019”, acrescenta. Freitas exemplifica que os serviços que tendem a ser mais impactados são os de saúde (médicos e odontologia), financeiros e educação. O presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis de São Paulo (Sescon-SP), Reynaldo Lima, também critica o projeto que está na Câmara dos Deputados, ressaltando que o maior custo tributário para os negócios de serviços está na folha de pagamentos. Por conta disso, ele está mais simpático à proposta que está sendo desenhada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, cujo princípio é muito parecido com o que defende o Secretário Nacional da Receita Federal, Marcos Cintra. O que se cogita na esfera da União é a criação de um imposto único juntando somente tributos federais: IPI, PIS, Cofins, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e contribuição previdenciária sobre a folha de pagamentos. Este novo tributo deve incidir sobre os meios de pagamentos, como os cheques, cartões de crédito e dinheiro vivo, ao modelo da extinta CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). “Essa proposta parece ser mais interessante”, opina o presidente da Sescon-SP. “Se a folha for desonerada, você reduz um percentual relevante dos gastos do setor de serviços”, complementa Lima. Para o assessor da CNS, esse modelo pode até mesmo incentivar a formalização do trabalho, uma vez que a contribuição das empresas para o INSS não será mais declaratória e, sim, automática – o imposto será cobrado direto nas transações financeiras. “Muitas empresas optam pela informalidade para não terem de pagar a contribuição sobre a folha. Isso é ruim, porque atrapalha a aposentadoria dos funcionários, por exemplo”, comenta Freitas. Alexandre Sansone Pacheco, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), avalia que a proposta de Guedes é mais “razoável” por não interferir na autonomia dos Estados e municípios. Tanto a PEC 45/2019 como a proposta de reforma tributária do ex-deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB), ressuscitada na semana passada pelo Senado, preveem a criação de um órgão federal para a repartição dos recursos. A diferença do projeto de Hauly é que este propõe uma junção mais ampla de tributos. São nove ao todo: ISS, ICMS, IPI, PIS, Pasep, Cofins, Cide, IOF e salário-educação. Centralização Para Pacheco, transferir a gestão do tributo para a esfera da União pode ferir o artigo 60 da Constituição Federal que estipula que “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado”. “A ideia do princípio federativo é dividir as funções e a tomada de decisões entre os diferentes entes. Não é prudente unificar a legislação nas mãos do governo federal”, diz Pacheco. Além disso, ele avalia que, neste momento de déficit fiscal, não somente na União, como nos estados e municípios, não é recomendável uma mudança muito profunda na estrutura de tributação. Já o sócio Douglas Mota, da Demarest, tem uma preocupação semelhante. Para ele, é importante que se faça uma reforma, mas é preciso calcular bem as perdas. “Nós só ficamos preocupados de que a reforma possa provocar aumento de carga e perdas de direitos. Não podemos criar mais problema”, ressalta Mota. PAULA SALATI • SÃO PAULO
Fonte: DCI - ECONOMIA
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