A Fazenda Nacional tenta evitar a aplicação, pelas instâncias inferiores, da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que retirou o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. O órgão solicitou a suspensão do andamento de todos os processos no país que tratam do tema até o trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso) do caso analisado em março pelos ministros, por meio de repercussão geral. Desde o julgamento, a União assiste à corrida dos contribuintes à Justiça e a aplicação do precedente – inclusive em casos envolvendo outros tributos. Já foram propostas mais de 7 mil novas ações sobre o mesmo tema, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). O pedido pode afetar ainda 8,25 mil processos sobrestados – parte liberada – e 200 mil execuções fiscais. Com o sobrestamento, a PGFN quer evitar a proliferação de decisões que poderiam ser posteriormente afetadas com uma possível modulação dos efeitos do julgamento. O órgão defende o efeito prospectivo: a aplicação do entendimento a partir de 2018, sem efeito retroativo. Esse pedido já foi feito pela PGFN na tribuna, mas só será analisado por meio de embargos de declaração – que só poderão ser apresentados após a publicação do acórdão do julgamento. O STF tem até meados de setembro para publicá-lo (prazo de 60 dias que pode ser prorrogado duas vezes). Mesmo sem o acórdão, a decisão vem sendo aplicada pelas instâncias inferiores, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O mesmo entendimento, segundo a PGFN, vem sendo usado inclusive em processos com temas diferentes – envolvendo Imposto de Renda, IPI, ISS e Imposto de Importação. Para o órgão, seria necessário aguardar a publicação do acórdão para aplicar o precedente. Na petição, afirma que, caso seja concedida a modulação de efeitos, todas as decisões judiciais desse intervalo teriam que ser revistas. Assim, o sobrestamento se justificaria pela segurança jurídica. O pedido cita previsão do novo Código de Processo Civil (CPC), de que, uma vez reconhecida a repercussão geral, o relator da ação no Supremo determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes que tratem sobre o assunto. Os advogados que representam o contribuinte no leading case julgado em março, a Imcopa Importação, Exportação e Indústria de Óleos, contestaram o pedido. De acordo com Fábio Martins de Andrade, sócio do escritório Andrade Advogados Associados, o mais correto seria apressar a publicação do acórdão e não sobrestar processos. "A Fazenda tenta engendrar manobras para postergar o desfecho desse caso", afirma. A publicação da ata do julgamento já permite a aplicação do precedente, de acordo com o advogado. Além disso, acrescenta, se a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins é inconstitucional, o quanto antes a União cessar a cobrança desses valores, menos terá que ressarcir os contribuintes no futuro. Segundo Martins de Andrade, o pedido da Fazenda, apesar de citar o novo CPC, contraria seu intuito, que é valorizar os precedentes. "Os embargos também não têm efeito suspensivo. Não há motivo para sobrestar processos Brasil afora. Isso é querer que a decisão do STF não tenha efeito", diz. O advogado Paulo Tedesco, sócio do escritório Mattos Filho, destaca que o sobrestamento de processos ganhou força com o novo CPC, mas não da forma pretendida pela PGFN. "A lógica da legislação aponta para uma possível suspensão antes do julgamento", afirma. Tedesco lembra que o tema foi julgado em 2014 sem repercussão geral no STF e o resultado foi o mesmo. "Quanto mais [a PGFN] empurra a decisão, mais meses terá que devolver para mais contribuintes e a bola de neve continua se avolumando." A PGFN, segundo Bruno Henrique Coutinho de Aguiar, sócio do escritório Rayes e Fagundes Advogados Associados, está tentando defender seus interesses e criar uma insegurança jurídica a seu favor. O pedido de sobrestamento, acrescenta, pode atemorizar contribuintes que já tentam aproveitar a decisão do STF no momento de crise pelo qual passa o país. "Não tem como sobrestar algo que já está julgado", diz. O advogado espera que o acórdão seja publicado em agosto, após o fim do recesso. De acordo com ele, a decisão do STF pela exclusão do ICMS é "irremediável", já que os embargos não têm poder de modificar o mérito. "A tese já está ganha e pacificada, faltam só procedimentos burocráticos." O STF informou que o processo encontra-se no gabinete da relatora, ministra Cármen Lúcia. Não há previsão da data de publicação do acórdão nem para a resposta ao pedido de sobrestamento. O tema é um dos mais relevantes para a Fazenda Nacional. De acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017, a Receita Federal deixaria de arrecadar R$ 250,3 bilhões em tributos questionados na Justiça entre 2003 e 2014. Além disso, a estimativa é que o Fisco deixe de receber R$ 20 bilhões por ano. No pedido de sobrestamento, a PGFN afirma ainda que só depois da publicação do acórdão dos embargos de declaração – que ainda serão apresentados – deixará de contestar e de recorrer. E somente após essa fase, a Receita Federal deixará de incluir o ICMS em seus lançamentos de ofício e atenderá os pedidos de restituição e compensação, segundo o órgão. Por Beatriz Olivon | De Brasília
Fonte: VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
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